TJUE confirma: Violação ao RGPD não gera automaticamente direito a indenização por danos morais
Por meio de decisão de 14 de junho de 2024 (proc. C-300/21), o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) esclareceu que uma mera violação das disposições do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) não gera, por si só, o direito à indenização. A pessoa afetada deve de fato ter sofrido um dano material ou imaterial e demonstrá-lo em caso de litígio. A decisão fornece orientação juridicamente vinculativa a empresas e órgãos que processam dados para lidar com riscos de responsabilidade em matéria de proteção de dados, impactando também de forma significativa a jurisprudência dos tribunais nacionais em casos de violações à proteção de dados.
Contexto do processo de reenvio prejudicial
O processo teve origem na Áustria. Um autor acionou um operador de plataforma online alegando violação ao RGPD e pleiteando indenização por dano moral. Seu pedido baseou-se exclusivamente no fato de que seus dados pessoais teriam sido processados de forma ilegal, sem, contudo, indicar qualquer prejuízo concreto resultante – como desconforto ou outra afetação. O Tribunal Regional de Viena, responsável pelo caso, submeteu diversas questões ao TJUE quanto à interpretação do art. 82 do RGPD, buscando esclarecer se a mera violação das disposições de proteção de dados já seria suficiente para fundamentar um pedido de indenização.
Avaliação jurídica pelo TJUE
Requisitos do direito à indenização conforme o art. 82 do RGPD
O TJUE afirmou que o RGPD estabelece uma regulamentação diferenciada para a reparação de danos. O art. 82 do RGPD prevê, de fato, responsabilidade em caso de infrações às normas de proteção de dados, mas exige, para o surgimento do direito à indenização, a presença de três requisitos:
- uma violação ao RGPD,
- um dano decorrente dessa violação, e
- um nexo causal entre a violação e o dano.
Assim, o Tribunal destaca que nem todo desvio das exigências do RGPD acarretará responsabilidade automaticamente. O direito à indenização exige que um prejuízo material ou imaterial tenha efetivamente ocorrido.
Não há automatismo em favor da pessoa afetada
Com essa decisão, o TJUE rejeita uma responsabilidade objetiva irrestrita. A simples constatação de uma infração à legislação de proteção de dados – seja por consentimento insuficiente ou omissão de informações – não basta para justificar o pagamento de valores por dano moral. Os afetados devem especificar de que modo sofreram, de fato e individualmente, um dano em razão da infração. Isso requer, com frequência, uma descrição detalhada do prejuízo sofrido – como surgimento de medos, estresse ou impacto no convívio social – e não apenas alegações genéricas ou abstratas.
Não há limiar mínimo para o dano imaterial
O TJUE esclarece ainda que não se pode impor um limite mínimo para o reconhecimento do dano, ou seja, apenas danos imateriais “significativos” não são os únicos a serem indenizáveis. Prejuízos menores também podem justificar o direito à indenização, desde que comprovadamente resultantes da violação ao RGPD e devidamente evidenciados no processo. Não obstante, seguem vigentes os critérios de prova quanto ao dano imaterial.
Consequências para a prática jurídica nacional e internacional
Reforço do princípio da responsabilidade individual
A decisão do TJUE enfatiza que empresas e responsáveis pelo tratamento de dados devem continuar a cumprir rigorosamente os requisitos do RGPD. Ao mesmo tempo, a decisão confere maior segurança jurídica e evita a expansão ilimitada dos riscos de responsabilidade por meras infrações técnicas ou formais ao RGPD, desde que não haja dano concreto demonstrado.
Na prática, isso significa que simples equívocos no tratamento de dados pessoais – seja em respostas a solicitações ou na documentação – não ensejam, automaticamente, obrigações financeiras em favor dos afetados. Apenas se comprovados danos concretos e individuais surge o direito à reparação.
Importância para empresas e responsáveis pela proteção de dados
Diante da recente decisão do TJUE, é recomendável dedicar atenção especial à documentação dos processos de tratamento de dados e possíveis riscos. Para operadores de dados, a decisão não reduz as exigências em termos de prevenção, sensibilidade e obrigação de registro – mas traz maior clareza quanto aos pressupostos para eventual direito à indenização.
Conclusão e perspectivas
A jurisprudência do TJUE representa um marco importante na articulação entre proteção de dados e responsabilidade civil. Ela promove uma diferenciação necessária entre mera infração e o efetivo dano causado. Assim, equilibra os interesses dos afetados e de empresas e operadores de dados. A decisão do TJUE será, provavelmente, determinante para a atual e futura regulamentação da responsabilidade civil em matéria de proteção de dados.
Para dúvidas adicionais ou inseguranças legais no contexto da proteção de dados, os advogados da MTR Legal Rechtsanwälte estão à sua disposição como interlocutores.